
Pergunta recebida na caixa de perguntas do Instagram:
“Fale um pouco sobre o tabu que existe em volta da vida amorosa das PcDs”.
Antes de iniciar, quero contar que a pergunta veio de uma mulher com deficiência, que tem ou já teve as suas experiências com tabu e amor e, com certeza, tem muito mais para falar sobre isso do que eu. Mas vamos lá!
Tabu é uma “convenção religiosa, moral ou social proibindo um determinado comportamento, objeto ou pessoa”. É, também, o “proibido ou fortemente desaprovado”. ¹
O tabu em questão é a proibição ou desaprovação social do relacionamento amoroso praticado por pessoas com deficiência. O que alimenta este tabu é o capacitismo, um julgamento moral que associa a capacidade, unicamente, à funcionalidade das estruturas corporais.² Logo, a conclusão capacitista: uma pessoa com deficiência não é plenamente funcional e não será capaz de se relacionar amorosamente.
Vamos refletir!
Para o desenvolvimento de qualquer relacionamento ao longo da vida são necessárias algumas habilidades sociais: comunicação, civilidade, fazer e manter amizade, empatia, assertividade, expressão de solidariedade, manejo de conflitos e resolução de problemas interpessoais, expressão de afeto e intimidade, coordenação de grupo e falar em público.³
Especificamente, para o relacionamento amoroso, faz-se necessário saber fazer contatos iniciais, marcar encontros, incentivar interesse do outro, aumentar intimidade, expressar sentimentos, perceber as emoções e necessidades do outro, negociar, fazer e ouvir críticas, manejar a individualidade na relação, entre outros aspectos igualmente importantes.
Quando falo de relação amorosa, estou considerando, no mínimo, a existência de duas pessoas envolvidas. (“No mínimo duas” porque existem as relações de poliamor, que não serão aprofundadas aqui.) Assim, na relação, ambos deveriam ter as habilidades sociais, minimamente desenvolvidas, para iniciar e manter um relacionamento amoroso.
Pergunto: Somente pessoas com deficiência têm dificuldades na vida amorosa?
Não, não é mesmo?
Se alguém afirma, por exemplo, que uma pessoa com deficiência, com alguma dificuldade na comunicação, necessariamente, terá um prejuízo no relacionamento amoroso, não está considerando que, a outra parte da relação, pode ter abertura e interesse em compreender o que é expresso, exatamente, do jeito que é ou ainda, juntos, desenvolverem outras formas de comunicação, particulares daquele casal. Relacionar-se é construir junto.
Olhar, sob os filtros do tabu e do capacitismo, impede de ver a pessoa que existe, antes da deficiência. E é esse olhar que sustenta a ideia de que pessoas com deficiência não se relacionam amorosamente e, se o fazem, é algo bizarro ou vulgar. Outras vezes, a colocam como incapaz, sem autonomia e sem consciência das escolhas e dos desejos e que, com certeza, está sendo enganada ou abusada na relação.
Se existe o tabu, é porque existe quem mantém este tabu, ou seja, quem pratica o capacitismo. Isto é o que mais impede, dificulta ou distorce o relacionamento amoroso da pessoa com deficiência.
O que você pensa sobre isso?
* Já gravei um vídeo sobre a sexualidade relacionada às pessoas com deficiência: “Devotees, Pretenders e Wannabes”. É só procurar no YouTube, Instagram e no site. Clique aqui para ver o vídeo.
Texto escrito por Aline Kimura, psicóloga criadora e responsável pela PsicoReab.
1 VANDERBOS, G. R. Dicionário de Psicologia da APA. Porto Alegre: Artmed, 2010.
2 MELLO, A. G. Deficiência, incapacidade e vulnerabilidade: do capacitismo ou a preeminência capacitista e biomédica do Comitê de Ética em Pesquisa da UFSC. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 21, n. 10, p. 3265-3276, 2016.
http://dx.doi.org/10.1590/1413-812320152110.07792016.
3 DEL PRETTE, A. e DEL PRETTE, Z.A.P. Competência social e habilidades sociais. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2017.
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